segunda-feira, 29 de julho de 2013

Escola do rock

De aprendiz a referência, Fábio Cascadura mantém há 21 anos a banda que carrega no nome

Fábio Cascadura: mais de duas décadas de rock e
um curso de história na Ufba

Da Muito

Às análises sobre os recentes protestos realizados em todo o Brasil, Fábio Cascadura, 43, acrescentou ciência. É que o frontman de banda de rock, papel que exerce desde moleque, quando ouviu Beatles e quis fazer igual, agora pula entre aulas do curso de história na Ufba. "O grande triunfo dessas manifestações foi ter aberto o campo; desfragmentado pautas, constrangido o poder e a mídia", diz, sentado numa escada do Pavilhão de Aulas nº 5, em Ondina. 
Parte do exercício (observar a insatisfação difusa e generalizada como que pesquisa) está em sua página no Twitter. A mesma que ele utiliza, ainda que de forma mais comedida, para divulgar shows e projetos do Cascadura, grupo que mantém há 21 anos, sinônimo de música feita na Bahia. A moderação na freqüência sonora vem menos de sua atual condição de estudante e mais da bandeira fincada pela banda, um passo à frente.
“Não dá mais pra fazer show toda semana, porque os convites que a gente aceita são aquele que dão espaço para que possamos fazer as nossas coisas. Nosso repertório hoje é o do último disco, que é mais complexo, difícil de executar”.
Fábio refere-se à Aleluia (2012), gestado ao lado de Thiago Trad (com quem divide a condução do grupo desde 2002) e uma trupe – o produtor André T., Pitty, Letieres Leite & Orquestra Rumpilezz, Móveis Coloniais de Acajú, Nando Reis, Ronei Jorge. Diferente de Bogary (2006), o trabalho anterior, álbum “pau e pedra”, Aleluia é ensaio, sinuoso ao falar sobre Salvador, suas particularidades.
Banda: Cadinho (baixo), Fábio, Thiago Trad (bateria) 
e Du Txai (guitarra)
Há canções sobre A Mulher de Roxo, velha elite, anônimos: a faixa Chorosa veio depois de um encontro com um vendedor de vassouras. “A voz do cara era igualzinha ao do (cantor de soul) Otis Redding. As ruas de Salvador têm muito dessas coisas. O material humano é diverso e visível. Às vezes, até enche o saco, porque todo mundo é artista” ele diz, rindo.
Mas Aleluia é, sobretudo, um reposicionamento. O esforço para dizer o que se é. Em sua coluna, publicada no A Tarde, no início deste ano, Caetano Veloso versou sobre o resultado. “Um trabalho extenso e denso, um disco de responsa, que todos os amantes de rock deveriam ouvir”.
“Nessas duas décadas, já pensamos muito em parar. Bagary foi feito como um encerramento. Mas o disco dói se retroalimentando. Veio o clipe, a nossa presença em festivais”, lembra Fábio. “Então, perseguimos um trabalho que fosse um reverência a quem nos acompanha e a nossa história; Aleluia é isso”.

LADO B – Quando fala, Fábio traz a marca de quem foi criado em lojinhas de vinis. Cita bandas do lado B, obscuridades para entendidos encontradas nos inferninhos musicais de Salvador dos anos 1980 – o mais celebrado, Kaya Discos, que funcionou na Ladeira de Santa Tereza, foi onde ouviu o pós-punk do The Cult e viu aí um caminho para a banda que fundaria mais tarde, responsável pela ruptela no seu RG original, Fábio Silva Magalhães. Antes, porém, passou por bandas de amigos (mais deles do que suas) e vendeu ele próprio discos em lojas.
A fala de Fábio traz, também, a constante busca pelo plural. Ao esbarrar na pessoalidade do ‘eu’, apruma um ‘nós’. Uma defesa aos que o fazem “líder” e tratam a Cascadura como a banda de um homem só. O que Fábio atribui a alta rotação de integrantes que marcou seu início, com os álbuns #1 (1997) e Entre (1999).
“No fim dos anos 90, depois de muita gente ter embarcado e saído do grupo, fiquei tentando achar um rumo. Apenas durante esse tempo Cascadura foi um projeto apenas meu. Mas como regra, é uma via de muitas mãos”.
Com o baterista Thiago como nome fixo (nas gravações e shows, novos músicos são agregados), Fábio teve a experiência de projeção. A dupla desembarcou em São Paulo quando a cena confluía Pitty, Cachorro Grande, Dead Fish, Daniel Belleza e os Corações em Fúria, além de representantes do Mangue Beat. Uma “geléia catalisadora”, como Fábio define.
Pitty e Fábio durante apresentação no 
Video Music Brasil (2008)
“Quando você está lá, passa por situações difíceis, porque o mercado é um funil. Mas você está numa vitrine. A partir dali ganhamos visibilidade nacional”.
O que explica, então, o retorno a Salvador, em 2006? “Nossa ideia nunca foi ficar lá. Tivemos uma experiência que deu certo, mas nossa história sempre foi com Salvador. E voltamos num momento em que era possível produzir aqui. O acesso aos estúdios estava mais fácil e a internet começava a se mostrar como uma forma importante de divulgação”.

SELF-MADE – Com uma estrutura self-made – são os próprios Fábio e Thiago que movimentam o Facebook da banda, os estúdios são alugados ou emprestados, tudo é discutido e feito sem grilhões -, a Cascadura é classificada por Fábio como “uma banda na mesma freqüência do seu tamanho”. “Já tivemos oportunidade de embalar com uma galera do mal, nada a ver. Mas como não primamos pela coisa do ‘tenho que aparecer toda hora’, fica tudo bem”.
Na atual rotina na Ufba, às vezes, Fábio tropeça em quem conhece seu trablho. Como no dia em que foi reclamar da ausência de professor e recebeu do coordenador do curso um elogio a Aleluia. No circuito musical, é alvo de abordagens. Referência para novos músicos? “Talvez. A gente tem consciência do nosso lugar, mas não convicção disso. Convicção paralisa”.

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