De aprendiz a referência, Fábio Cascadura mantém há 21 anos a banda que carrega no nome
Fábio Cascadura: mais de duas décadas de rock e um curso de história na Ufba |
Da Muito
Às análises sobre os recentes protestos realizados em todo o Brasil, Fábio Cascadura, 43, acrescentou ciência. É que o frontman de banda de rock, papel que exerce desde moleque, quando ouviu Beatles e quis fazer igual, agora pula entre aulas do curso de história na Ufba. "O grande triunfo dessas manifestações foi ter aberto o campo; desfragmentado pautas, constrangido o poder e a mídia", diz, sentado numa escada do Pavilhão de Aulas nº 5, em Ondina.
Parte do exercício (observar a insatisfação difusa e generalizada como que pesquisa) está em sua página no Twitter. A mesma que ele utiliza, ainda que de forma mais comedida, para divulgar shows e projetos do Cascadura,
grupo que mantém há 21 anos, sinônimo de música feita na Bahia. A moderação na freqüência
sonora vem menos de sua atual condição de estudante e mais da bandeira fincada
pela banda, um passo à frente.
“Não dá mais pra fazer show toda semana, porque os convites
que a gente aceita são aquele que dão espaço para que possamos fazer as nossas
coisas. Nosso repertório hoje é o do último disco, que é mais complexo, difícil
de executar”.
Fábio refere-se à Aleluia (2012), gestado ao lado de Thiago
Trad (com quem divide a condução do grupo desde 2002) e uma trupe – o produtor
André T., Pitty, Letieres Leite & Orquestra Rumpilezz, Móveis Coloniais de Acajú,
Nando Reis, Ronei Jorge. Diferente de Bogary (2006), o trabalho anterior, álbum
“pau e pedra”, Aleluia é ensaio, sinuoso ao falar sobre Salvador, suas
particularidades.
Banda: Cadinho (baixo), Fábio, Thiago Trad (bateria)
e Du Txai (guitarra)
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Há canções sobre A Mulher de Roxo, velha elite, anônimos: a
faixa Chorosa veio depois de um encontro com um vendedor de vassouras. “A voz
do cara era igualzinha ao do (cantor de soul) Otis Redding. As ruas de Salvador
têm muito dessas coisas. O material humano é diverso e visível. Às vezes, até
enche o saco, porque todo mundo é artista” ele diz, rindo.
Mas Aleluia é, sobretudo, um reposicionamento. O esforço
para dizer o que se é. Em sua coluna, publicada no A Tarde , no início deste
ano, Caetano Veloso versou sobre o resultado. “Um trabalho extenso e denso, um
disco de responsa, que todos os amantes de rock deveriam ouvir”.
“Nessas duas décadas, já pensamos muito em parar. Bagary foi
feito como um encerramento. Mas o disco dói se retroalimentando. Veio o clipe,
a nossa presença em festivais”, lembra Fábio. “Então, perseguimos um trabalho
que fosse um reverência a quem nos acompanha e a nossa história; Aleluia é isso”.
LADO B – Quando fala, Fábio traz a marca de quem foi criado
em lojinhas de vinis. Cita bandas do lado B, obscuridades para entendidos
encontradas nos inferninhos musicais de Salvador dos anos 1980 – o mais
celebrado, Kaya Discos, que funcionou na Ladeira de Santa Tereza, foi onde
ouviu o pós-punk do The Cult e viu aí um caminho para a banda que fundaria mais
tarde, responsável pela ruptela no seu RG original, Fábio Silva Magalhães. Antes,
porém, passou por bandas de amigos (mais deles do que suas) e vendeu ele próprio
discos em lojas.
A fala de Fábio traz, também, a constante busca pelo
plural. Ao esbarrar na pessoalidade do ‘eu’, apruma um ‘nós’. Uma defesa aos
que o fazem “líder” e tratam a Cascadura como a banda de um homem só. O que Fábio
atribui a alta rotação de integrantes que marcou seu início, com os álbuns #1
(1997) e Entre (1999).
“No fim dos anos 90, depois de muita gente ter embarcado e
saído do grupo, fiquei tentando achar um rumo. Apenas durante esse tempo
Cascadura foi um projeto apenas meu. Mas como regra, é uma via de muitas mãos”.
Com o baterista Thiago como nome fixo (nas gravações e
shows, novos músicos são agregados), Fábio teve a experiência de projeção. A dupla
desembarcou em São Paulo
quando a cena confluía Pitty, Cachorro Grande, Dead Fish, Daniel Belleza e os
Corações em Fúria, além de representantes do Mangue Beat. Uma “geléia catalisadora”,
como Fábio define.
Pitty e Fábio durante apresentação no
Video Music Brasil (2008)
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“Quando você está lá, passa por situações difíceis, porque o
mercado é um funil. Mas você está numa vitrine. A partir dali ganhamos
visibilidade nacional”.
O que explica, então, o retorno a Salvador, em 2006?
“Nossa ideia nunca foi ficar lá. Tivemos uma experiência que deu certo, mas
nossa história sempre foi com Salvador. E voltamos num momento em que era possível
produzir aqui. O acesso aos estúdios estava mais fácil e a internet começava a
se mostrar como uma forma importante de divulgação”.
SELF-MADE – Com uma estrutura self-made – são os próprios Fábio
e Thiago que movimentam o Facebook da banda, os estúdios são alugados ou
emprestados, tudo é discutido e feito sem grilhões -, a Cascadura é
classificada por Fábio como “uma banda na mesma freqüência do seu tamanho”. “Já
tivemos oportunidade de embalar com uma galera do mal, nada a ver. Mas como não
primamos pela coisa do ‘tenho que aparecer toda hora’, fica tudo bem”.
Na atual rotina na Ufba, às vezes, Fábio tropeça em quem
conhece seu trablho. Como no dia em que foi reclamar da ausência de professor e
recebeu do coordenador do curso um elogio a Aleluia. No circuito musical, é
alvo de abordagens. Referência para novos músicos? “Talvez. A gente
tem consciência do nosso lugar, mas não convicção disso. Convicção paralisa”.
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